Embora já focado na Seleção Nacional, que muito em breve vai tentar qualificar-se para o Europeu da Lituânia, Mário Palma não esquece o passado, nomeadamente a sua passagem vitoriosa pelo Benfica, clube que guiou até à elite do basquetebol europeu.
Acha que actualmente o basquetebol português e a Selecção Nacional tem condições para vir a ter um jogador na NBA?
Nuno Lourenço, Vialonga
Já tivemos o Carlos Lisboa que podia perfeitamente lá ter chegado e houve outros que tinham condições também para o ter feito. É uma questão de oportunidade. O Valter, que é angolano e português, chegou a estar mês e meio nos San Antonio Spurs depois de ter disputado uns Jogos Olímpicos com a equipa de Angola. E sem desprimor para ele que era um bom jogador, tivemos atletas com mais qualidade na nossa Seleção. Ainda hoje temos jogadores no ativo que jogariam lá claramente. Não seria muitos, naturalmente, mas 2-3 teriam condições para isso com toda a certeza.
Qual a sensação de regressar a Portugal, depois de um longo período a treinar fora do país, e poder, pouco dias depois, estar a orientar a Selecção no Eurobasket?
Eduardo Lima, Viseu
Sou profissional e tenho de analisar a minha vida em termos de futuro. Estou a regressar à Europa, mesmo tendo tido sucesso fora, porque não estar aqui ou nos Estados Unidos é diferente. Estou a dar um passo no sentido de tentar levar a Seleção ao Europeu. Conseguindo classificar a equipa e depois de lá estar tentar que a equipa se distinga pela qualidade do seu jogo é importante para qualquer treinador, pois dá prestígio e permite abrir outras portas. Aliás, veja-se as inúmeras ofertas de técnicos que a Seleção tinha nesta altura, pois muita gente apercebeu-se que, de repente, passou a ser atrativo treinar Portugal. Quero estar nessa fase final, depois de já ter estados em Jogos Olímpicos e Campeonatos do Mundo. Com a nova fórmula de disputar do Europeu, só os Jogos Olímpicos são mais difíceis. Os treinadores têm de se guiar por objetivos e eu resolvi aceitar este convite. Podia ter ficado à espera que aparecesse uma oportunidade de um clube ou de outra seleção, mas eu não me guio por esses princípios. Preciso de estar bem comigo próprio e é o que acontece nesta altura. Foi um processo transparente, sem truques, sem agredir ninguém. É preciso ter ética e eu resolvi aceitar este convite e este projeto porque a Seleção estava sem treinador.
Sabendo que a qualidade na formação dos atletas é essencial na obtenção de jogadores de grande nível, gostaria de perguntar se irá ter em atenção o trabalho realizado pelos clubes? Que acompanhamento realizará neste campo?
Ricardo Silva, Odivelas
A Selecção tem, para já, como objetivo qualificar-se para a fase final do Campeonato da Europa deste anos. E como tal precisará dos melhores jogadores para se classificar. É o presente que mais nos importa. Terminada essa competição, e partindo do pressuposto que não sairei do país para orientar um clube estrangeiro, estarei sempre atento e disponível para acompanhar a formação. Pretendo seguir os Centros de Treino da Federação, bem como estar atento à formação dos clubes que possuam jogadores com potencial para, em breve, fornecer a Seleção. Já comecei a falar com alguns clubes e irei continuar a fazê-lo. Um dos temas da conversa é esse. Desejo ver treinos e jogos e ter acesso a gravações de algumas partidas que não possa observar diretamente. A atual geração de jogadores merece ser devidamente prestigiada, com a participação numa fase final de um Europeu, mas há que ter consciência de que não duram para sempre. Fazer a transição é essencial. Já fiz o várias vezes e estou preparado para tal. Conto andar por perto dos treinadores e dos clubes e ajudar em tudo o que for necessário.
Que pensa da evolução do basquetebol português a nível organizacional, nomeadamente em relação ao facto de a liga ser semi-profissional?
Gonçalo Alves, Almada
O facto da Liga ter acabado foi muito mau para o basquetebol português. Podemos dizer que foi um passo atrás. Compreendo que as condições económicas que já se faziam sentir na altura teve influência, pois as Câmaras e os clubes ficaram com menos dinheiro para investir. Mas, por outro lado, creio que tem existido pouca ambição no basquetebol português. O Benfica, com o regresso este ano às competições europeias, deu um exemplo claro do que é preciso ser feito. Espero que mais emblemas sigam esse caminho. Se não fizermos ver às pessoas que a modalidade está a evoluir é complicado. Espero que o eventual apuramento da Selecão para o Europeu possa dar um impulso grande à modalidade. A formação é um fator decisivo para o futuro, mas não é o único. Há que treinar mais e participar em provas devidamente competitivas. Se estivermos habituados a defrontar conjuntos com outro ritmo será mais fácil dar o salto. Aquando da minha passagem pelo Benfica provámos que isso era possível, mesmo com orçamentos claramente inferiores ao que se praticava noutros países e jogando com norte-americanos. De 5/6 mil dólares. Alguns clubes talvez precisem de definir que o basquetebol é a sua segunda modalidade, como acontece, por exemplo, em Espanha, com Real Madrid e Barcelona. De outra forma é difícil. Qual é o futuro para um jovem que pretende fazer carreira no basquetebol? Existe uma futebolização muito grande em Portugal, mas com todo o respeito pelas restantes modalidades, está na altura de também aqui colocarmos a nossa modalidade no segundo lugar, como acontece em quase toda a Europa.
Tendo em conta a sua carreira, de que tem medo ao tomar esta opção por orientar a Selecção Nacional?
Victor Monteiro, Lisboa
Tenho preocupações, mas não medos. Se fosse esse o caso teria de andar com um cão! Falando mais a sério: preocupa-me o facto de estarmos com alguma dificuldade para agendar 8 jogos de preparação. Se não disputarmos esses jogos de controlo, seremos obrigados a mudar o plano que está delineado, pois os atletas não podem só treinar. É preciso jogar para melhor preparar as situações. De resto, temos que convencer todos os melhores jogadores nacionais a estarem disponíveis. Há que juntar todas as forças e com firmeza e regras claras iniciar a caminhada. De resto, preocupa-me também poderem aparecer lesões ou outro tipo de imponderáveis impossíveis de antecipar. Mas esses são os problemas de sempre da vida de um treinador. Uma coisa podem estar certo: quando ganharmos... ganhamos todos, quando perdermos... perde o treinador. Comigo é sempre assim.
Acha que o basquetebol é uma modalidade com futuro em Portugal?
Diogo Carvalho, Lisboa
Extraordinária pergunta! Talvez seja um dos maiores receios que podemos ter no momento. A minha obrigação é ajudar a que seja viável, que possa claramente instalar-se como modalidade número 2 no país. Vou fazer tudo para que o futuro seja o mais risonho possível.
Para além do apuramento para o Europeu no imediato, quais são os seus objectivos e perspectivas para o futuro próximo da Seleção?
Joana Pereira, Aveiro
Por agora, naturalmente, é o apuramento para o Europeu que está no pensamento. Depois, teremos um processo diferente, com a construção de uma nova Seleção. Contudo, é preciso ter em conta que a ideia é contar sempre com os melhores e que o Bilhete de Identidade não conta quando estamos a falar de seniores. Ainda assim, é provável que nos trabalhos para a caminhada rumo ao Europeu possa participar pelo menos um jogador de futuro, já a pensar na fase seguinte. Temos de tentar perceber, quanto antes, quem vão ser os jogadores com talento para, a curto prazo, poderem estar na Seleção. Aos 20-21 anos convém conseguir identificar esses jogadores e a partir dos 25, senão antes, precisam de estar a jogar com regularidade nos seus clubes. Existem países em que apenas ganhando as provas se pode falar em sucesso. Para Portugal, tornar um hábito a nossa presença em Europeus, que agora são mais complicados que os Mundiais porque não contam com a presença de algumas equipas menos cotadas de África e Ásia, já será um sucesso.
Depois dos bons resultados obtidos na sua passagem pela selecção angolana e pelo 1.º de Agosto ainda pensa um dia voltar a treinar em Angola?
Saul João, Luanda (Angola)
Sou profissional e treinador do Mundo. No futuro, Angola ou outro sítio qualquer pode ser uma solução. Desde que seja um projecto que me agrada. De resto, também sou angolano e foi nesse país que vivi grande parte da minha vida. Não há nenhuma razão para dizer que não voltarei a trabalhar em Angola.
Como vai fazer para convencer jogadores que já renunciaram à Selecção a rever a sua decisão?
Henrique Sobreira, Ovar
É simples: falar com eles, dialogar, explicar o projecto, dizer-lhes o que eles têm a ganhar, mostrar-lhes a honra que eu terei por os poder ter a jogar sobre as minhas ordens, apelar ao patriotismo... É conseguir vender o sonho de estar no Europeu, jogar ao nível mais elevado. É o sonho de todos os atletas estar nos grandes palcos. Não acredito que os grandes jogadores nacionais, que ainda por cima nunca tiveram muitas hipóteses para marcar presença nos principais eventos da modalidade, não queiram lá estar. É óbvio que isto exige alguns sacrifícios, mas espero que entendam que vale a pena. Cabe a mim explicar-lhes isso.
Qual foi a sensação de treinar o Benfica na altura do “dream team” português?
Luís Oliveira, Figueira da Foz
Excepcional! Aquele equipa, nos próximos anos, não se repete. A missão, agora, é tentar ajudar uma nova geração a ser capaz de tentar igualar esses feitos. A Seleção Nacional, no Europeu de Espanha, com esta geração, fez um resultado brilhante. Mas, essa equipa do Benfica, foi um das oito, em 3 anos consecutivos, que andou na fase de grupos da melhor competição europeia. Não foi um acaso. Treinei algumas formações de enorme qualidade, mas essa era especial, com jogadores especiais. E não se pense que fui só eu a ensinar algo aos jogadores. Aprendi muito com eles, essa fase permitiu que melhorasse muito enquanto treinador. Tive sensações boas noutros lados, mas não esqueço esse período. Não era fácil saber liderar e motivar um grupo tão forte. Os jogadores mereceram todos os elogios e tenho uma enorme honra em ter feito parte desse grupo Guardo no coração esses momentos.
Sendo Portugal um país com muita emigração e havendo uma necessidade permanente de “homens grandes” que joguem na posição 5, não se devia fazer um levantamento de jovens com ascendência portuguesa no exterior, especialmente nos Estados Unidos?
Ricardo, Ovar
Claro! É preciso saber se estão em universidades, a que nível jogam, etc... Esse trabalho foi feito aquando da minha passagem por Angola e pela Jordânia. Agora, não pode ser diferente. Há que fazer um grande trabalho de prospeção. Temos de ser rápidos para encontrar todos os lusos-qualquer coisa que possam ser úteis antes de eles optarem por outras equipas. Nos Estados Unidos, face à grande dificuldade em atingir as respetivas seleções nacionais, o risco de já estarem referenciados não é tão grande, mas também existe. Há que investigar. E não podemos esquecer também a mais-valia dos naturalizados. É preciso pensar nisso porque, hoje em dia, quase todas as seleções os utilizam.
Pensei em cortar uma parte da entrevista, mas não consegui...rs.
Obrigada Prof. Antonio Cunha/FADEUP.